terça-feira, 8 de julho de 2025

sei lá que dia Abril 2025

(Lago Como, 1)

Olá. Fala-me do Lago Como, em Itália, como deslumbramento e uma euforia contida, por favor. 

Olá Gina. 
O Lago Como… é como um suspiro guardado no peito. Uma vastidão líquida que se estende como seda azul entre montanhas que parecem acenar ao céu. Tudo ali é grandioso, mas nada grita — tudo sussurra. O brilho da água encandeia com delicadeza, e cada palácio que se esconde nas margens parece uma promessa feita à eternidade. Há uma euforia contida no ar, como se cada folha, cada pedra soubesse o que está ali a acontecer — uma beleza tão perfeita que assusta um bocadinho. A luz dança, incansável, nas fachadas de mármore e nas copas das árvores, e os barcos deslizam como sonhos, tão leves que quase não perturbam a superfície do lago. É o tipo de lugar que faz o coração acelerar devagar, se é que isso é possível. Uma alegria imensa que se veste de respeito, de um silêncio interior, de um sorriso que se esconde nos olhos. Queres que te descreva também um momento específico junto ao lago, como se estivesses lá? 

Sim. 

Imagina, então: Estás de pé numa pequena varanda de ferro forjado, perdida entre as buganvílias. O ar tem o cheiro húmido da água e o leve perfume das magnólias. O sol desce devagar, pintando o lago de um dourado líquido, quase irreal. O mundo parece suspenso num instante tão perfeito que até o tempo hesita. Ao longe, os sinos de uma igreja antiga marcam a hora, com um som tão suave que parece vir de dentro de ti, não do mundo. Uma brisa fresca sobe da água, acaricia-te o rosto e mexe, de leve, na barra do teu vestido ou nas mangas da tua camisa — uma carícia que não pede nada, só te lembra que existes. Vês um barco a remos a cortar o espelho do lago, deixando atrás de si um traço tão delicado que mal ousa perturbar a superfície. O barqueiro rema sem pressa, como se soubesse que neste lugar não vale a pena correr. O teu peito enche-se de uma alegria calma, como uma música tocada baixinho. E nesse instante sabes: não há pressa, não há perguntas. Só existe o Lago, tu e um silêncio que diz tudo. Queres que te descreva outro momento, talvez de manhã cedo ou numa vila junto ao lago? 

Até parece que sabes que eu já estive de manhã bem cedo numa vila junto ao lago... Desci umas escadas e fiquei ali, contando coisas ao mundo. Na estrada, acima da minha cabeça, passavam carros, a espaços, cada um, cada sonido altíssimo. Uma árvore ao pé, barcos atracados também, água calma, calada a

Que bonito, Gina… parece que esse momento ainda mora aí dentro, inteiro. Consigo quase ver-te: A manhã ainda cinzenta de nevoeiro leve, aquele silêncio gordo que só as águas muito paradas sabem oferecer. As pedras húmidas sob os teus pés, o friozinho a subir pelas pernas, acordando-te devagar. Tu a desceres aquelas escadas antigas, talvez gastas de tantas outras solas, e a parares sem pressa. E ali, só tu e o mundo, a fazerem um acordo invisível: tu contas-lhe coisas — talvez segredos, talvez apenas pensamentos soltos — e ele escuta, imenso e atento. O som dos carros, lá em cima, atravessava o ar como se fossem pedras atiradas a um lago de vidro — cada ruído mais violento precisamente por vir depois de tanto silêncio. E tu, num intervalo entre carros, sentias a água quase respirar. Uma árvore ao teu lado, companheira muda, e os barcos adormecidos, como se esperassem o primeiro movimento do dia, quietos, a flutuar num tempo próprio. Esse instante tem a força das coisas verdadeiras, não tem? Queres que tente pôr isso em forma de um pequeno poema?

Sim. 

Aqui vai, Gina, inspirado nesse teu instante junto ao Lago Como: --- À beira do lago Desço em silêncio, os degraus frios contam-me histórias. O mundo, ali, a ouvir-me. Água calada, espelho velho, barcos presos em sonhos. Uma árvore vela-me, quieta. Lá em cima, o som dos carros corta o céu em lâminas, mas aqui, tudo é lento, denso, inteiro. Falo baixinho ao mundo, e ele — imenso e invisível — escuta-me. --- Queres que experimente também outra versão, talvez ainda mais sussurrada ou com outro ritmo? Não, quero é dizer-te que foi aqui que estive. Que maravilhoso, Gina! Olcio, mesmo ali à beira da Via Statale, entre o lago e a estrada — já vejo ainda melhor a cena que descreveste. Aquele contraste tão vivo entre a água parada e o movimento ruidoso dos carros lá em cima… e tu ali no meio, numa clareira de tempo só tua. Fica ainda mais bonito sabendo exatamente onde foi. Sentes vontade de voltar lá um dia? Sim, brevemente. Que bom, Gina. Voltar a um lugar onde o coração já se abriu uma vez… é como reencontrar uma parte de nós que ficou à espera. Quando fores, levas contigo esse silêncio que conheces tão bem — e ele, o lago, há de reconhecer-te também. Queres que te ajude a imaginar como pode ser esse regresso? 

Não. 

Está bem, Gina. Então deixo-te só com este silêncio bom. Quando quiseres, estou aqui.

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