domingo, 31 de janeiro de 2021

Dia de (disseram na Radio)

Era dia de telefonar a alguém a quem não se telefone há muito tempo. Lembrei-me da minha ti Bia. Não há quem tenha ascendência aos Sules deste país e não tenha pelo menos uma ti Bia. Digo pelo menos uma porque quando era criança até tinha duas, o diferencial era a ti Bia do forno. Delas, uma era tia da outra. Ou seja: do mesmo modo que a minha ti Bia era minha tia, assim tinha uma tia que era a sua ti Bia. Já sei, está confuso. Ou seja: a minha ti Bia é irmã da minha mãe, a ti Bia do forno era irmã da minha avó materna. De maneiras que pronto, a minha ti Bia do forno era minha tia, mas em segundo grau. Já se percebeu, tenho essa esperança.
A minha ti Bia é a! ti Bia. Era quem nos dava guarida aquando das visitas ao Sul. Uma vez comentei que na sua casa não se podia comer mais nada senão cozido de grão ou sopas de tomate. Vai daí, na refeição seguinte, apresentou-me batatas fritas com ovo estrelado, isto porque antes eu lhe havia dito que nunca tinha comido disso lá. Soube-me bem e aprendi a lição. Gostava particularmente de a ver costurar. Uma vez, já jovenzinha, observei-a a costurar, cortando o tecido que apoiava nos joelhos. Contei-lhe aquela piada de 'fazer as coisas em cima dos joelhos'. Riu-se e anuiu. Achava o máximo que conseguisse saber onde cortar o tecido, principalmente porque nessa altura eu já andava na costura e portanto já tinha umas luzes acerca do assunto.
A ti Bia do forno tinha uma mercearia e dedicava-se também ao comércio de pão. Lembro que nesse forno também se fazia popias, só não lembro se outro tipo de bolos, mas lá que se faziam as popias que nunca esquecerei, faziam. Nunca mais encontrei popias de sabor igual. Às vezes há coisas que se vive na infância e parecem ter uma conotação inventiva - aquele sabor era extraordinário porque as papilas eram jovens, o tempo era outro, o lugar idem. Quiçá seja antes isso. Por falar em infância, eu adorava brincar com a enormíssima taça de bater a massa. Tinha uma pá gigantesca e a minha brincadeira era girar a taça. Ouvia logo o ralhete da minha mãe, claro, mas era irresistível girá-la e até apoiar-me naquilo para inventar um carrossel. Acho que, ainda hoje, pudesse eu rever a taça e. Sim, sim. E não, ainda não liguei à minha ti Bia.

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2 comentários:

  1. Adoro popias. E sim, também tenho (tive) uma ti Bia.
    :)

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    1. Eu também. Sempre que as vejo, compro. Mesmo que já não sejam a mesma coisa.
      E, acerca do teu Sul, mesmo que seja mais a sul do que o meu, bem me parecia que haverias de ter uma ti Bia.

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