Ontem, durante a chuvada da manhã, cruzei-me com um homem que foi do mais cavalheiro que vi até hoje. Ambos seguíamos o nosso caminho sem chapéu-de-chuva. Eu ia já bem molhada, cabelo a pingar e mais não sei o quê, ele não, mas creio que não se notava tanto por ter menos cabelo do que eu. Íamo-nos cruzar e foi em simultâneo que percebemos que um de nós teria de abandonar a parte seca do estreito telheiro e colocar-se debaixo de onde escorriam grossas pingas que molhariam quem de nós calhasse essa sorte. Em casos destes, ou em circunstâncias onde se usa de cortesia, não é meu costume hesitar, cedendo de bom grado o melhor lugar. Foi pois o que fiz, quem primeiro se orientou para se colocar debaixo das pingas fui eu, mas ele travou a minha intenção através de linguagem corporal, parando debaixo das pingas, que já referi serem grossas, liberando a parte seca do telheiro. Aproveitei e agradeci com voz, quiçá tenha inclusive falado através de linguagem corporal, e lembrei-me logo deste post. Normalmente ninguém vai para o dilúvio, todos dele fogem, por isso considero um acto raríssimo.
Não muito depois rejubilei com o sonante 'bom dia, Gina' da menina, e aproveitei o ensejo para lhe anunciar que já sabia o nome do cão da Heidi. É Joseph, não é? E ela fez que sim. Isto porque da outra vez bem que ela mo tinha repetido mas eu não percebi patavina. De seguida, a menina discursou véri véri eloquentemente acerca do quanto detesta o frio e a chuva e adora a primavera e o calor. Ah, eu não gosto do frio mas acho a chuva bonita, disse eu. Ela ficou a olhar para mim com aqueles olhos redondos e ainda um tudo-nada expectantes. Tu não? Perguntei. Ela fez que não. Comprovantes ou argumentos de nada serviriam, a petiza não tem ainda idade para certas poesias, por isso não segui o diálogo. Ainda que desta vez tenha falado por voz com ela, voltei a falar-lhe por gestos. Usei uma boneca que imita uma bebé para aí com três meses, sentei-a, amanhei-lhe o vestidinho e equilibrei-a. Mas não ficou bem, a cabeça ficava para baixo, assim não se lhe via os olhos. Hum. Lembrei-me que um bebé com três meses não tem estrutura para se sentar, o figurino estava portanto de acordo com a realidade, quase me ri com a constatação. Rodei então as perninhas até ficarem num ângulo que parecia incompatível com o equilíbrio, contudo, lá se manteve de cabeça erguida e sentada. Mesmo sendo uma bebé de três meses. E porque era uma boneca, pois claro. Atentei nos olhos, estavam fixos em ponto nenhum, tal como são os olhos dos bebés de três meses. Mas eu acho que não está certo, uma boneca tem que falar com os olhos, ou é esperar poesia onde não pode ainda havê-la?
Posta-restante:
O frio chegou, portanto e também, ontem, como que acompanhando a chuva, ou coisa assim. Nada como inventar poesia aqui e ali. Ai.
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